quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Coisa de cinema

Sabe quando a gente tá naquele estado meio dormindinho meio acordado? Pois é, eu tava nessas. Do outro lado do quarto, o nego tagarelava aquela tagarelice aleatória característica dele, mas eu o ouvia beeeeeeeeeeeeeem distante. Na verdade, a tagarelice dele é tão crônica que mesmo quando eu não estou com ele eu ouço sua tagarelice desse jeito, beeeeeeeeeeeeeeem distante, latejando na minha cabeça. Mas isso não vem ao caso.

Estava eu lá deitado, como já disse, meio dormindinho, como também já disse, quando ouvi alguns gemidos. Isso bastou pra que eu despertasse novamente, e nesse momento a tagarelice do nego me pegou desprevenido – aquela avalanche de palavras foi quase um sopapo na orelha! Eu, porém, rapidamente me recompus: o gemido estava cada vez mais alto e ritmado.

Agucei os sentidos e comecei a eliminar hipóteses. Não eram gatos namoricando no telhado (não dessa vez). Não era briga. Não era nenhum raptado preso num cativeiro agonizando, implorando por comida. Era sexo – e dos bons. Ou não. Uma vez meu irmão me disse que a gorila fêmea (maquiavélica como as fêmes de TODAS as espécies) tem um truquezinho interessante: quando o macho não é bom de 'cama', e eu disse NÃO é bom de 'cama', ela geme ainda mais alto, pra enganar as outras fêmeas e estimulá-las a copular com esse zé mané e, assim, evitar que tenham uma prole decente.

Bom ou não, o fato é que era sexo. Poxa, só o fato de ser sexo já era motivo suficiente pr'eu ficar ouvindo (e você leitor ou leitora, sem hipocrisia! Quem não gosta de ouvir qualquer barraco do vizinho?) mas, nem que eu quisesse, conseguiria deixar de ouvir. A moça tava muito satisfeita – ou não. Mas gemia alto!

De repente, uma pausa. Pouco tempo depois, o som de uma torneira abrindo, um copo enchendo, uma pessoa bebendo. Nessa hora – e só nessa hora, quando deu o 'recreio' – eu comentei com o nego:

    • Êita, a moça é dura na queda, o cabra até pediu água!

    • Quê? - perguntou o nego, daquele jeito meio grogue de quem acaba de despertar. Não, ele não dormia, foi desperto do transe que sua tagarelice causa nele mesmo...

    • Nego – eu disse – a vizinha tá transando com alguém!

    • Sério? - ele se animou. Com quem?

    • Sei lá...psiu, ouve, começou de novo!

    • Você tá ouvindo?

    • Sim, você não?

    • Não...

“Vixi. Será que eu tô tão necessitado que ando imaginando essas coisas...?” pensei.

    • A, agora, eu ouvi! Êita nóis! - o nego se empolgou com o lance.

Ele se levantou e foi até a janela do quarto, que estava aberta, e ficou espiando a casa da vizinha. Eu, com toda a minha inocência, quis ajudá-lo. Acendi a luz do quarto. O nego deu um salto do tipo 'duplo-twist-EScarpado' e me perguntou:

    • Você tá maluco? Eu aqui curiando a vida dos outros e você acende essa luz?

Apaguei a luz e caímos na gargalhada. Tão alta que os gemidos cessaram na casa ao lado. Quando conseguimos nos controlar, o silêncio reinou. Não sei se por atingir o clímax, ou se por descobrirem que eram motivo de graça, mas o fato é que o 'ato' tinha chegado ao fim. Estávamos voltando pra cama – CADA UM PRA PRÓPRIA CAMA! - quando ouvimos o barulho da fechadura da porta da vizinha:

    • Nego – eu disse – olha lá! Vamos ver quem é o cara que tava dando um 'talento ' na vizinha!

Grudamos os olhos na janela e qual não foi o nosso espanto ao descobrirmos que não era 'o cara', e sim 'OS caras' que deram um 'talento' na vizinha!

    • Nossa nego – disse o nego – eu pensava que essas coisas só aconteciam em filme...


Robson Ribeiro

domingo, 19 de setembro de 2010

Quebra-cabeça

Quando o rapaz entrou naquele lugar,

ele definitivamente não esperava encontrar

aquela bagunça toda. Tava uma zona danada!

Ele não fazia idéia do quão complicada

seria a tarefa de botar aquilo em ordem. Impossível!

Mas ficar bagunçado era inadmissível,

então ele começou a botar ordem.

Pelo menos ele achou que botava ordem.

Sabe aqueles quebra-cabeças de número ou letra

que parecem feitos de magia negra,

onde agente cobre um lado e descobre outro?

Ou aqueles do tipo cubo mágico

que de mágico só têm a rima com seu estado trágico

quando da nossa interferência,

da nossa inteligência?

Sabe quando a gente tenta arrumar algo no outro

mas não consegue, porque estamos arrumando

no lugar errado, porque estamos errando?

Pois é, o lance é mesmo muito complexo:

Nada vem de fora, nem mesmo o reflexo!

Alguém já reparou que o mundo só existe enquanto a morte não chega?

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Mesmo quando

Olá. Eu sei que você está aí.

Eu sei que você pode me ouvir.

Neste cosmo entre você e eu,

nas delícias do seu e do meu,

eu sei que está tudo se arranjando.

Eu sei, e sigo te procurando.

Sei que você existe pois

tudo nesse mundo é dois.

Bem e mal. Noite e dia.

Açúcar e sal. Tristeza e alegria.

Dualidade em tudo, comigo há de ser

da mesma forma. Há de existir você.

Sigo então o meu caminho,

tentando te encontrar. Tentando.

Enquanto não te acho, eu sonho.
Mesmo quando não te acho, eu te amo.

sábado, 4 de setembro de 2010

Pelo simples prazer

Hoje conversei com duas pessoas muito especiais. Uma durante a tarde e outra durante a noite. São duas amigas que havia muito eu não tinha uma conversa tão sincera e construtiva. Talvez eu nunca tenha tido tais conversas, até hoje. Pra variar, isso me faz pensar. A primeira pergunta: 'Por que deixamos que o tempo crie barreiras tão grandes entre nós e nossos amigos'?

Acho que isso acontece porque chega o momento em que cada um precisa procurar o seu rumo. Nós procuramos um relacionamento amoroso, um emprego, uma faculdade pra cursar. Não sobra tempo pros amigos, nem pra família e o pior: não sobra tempo pra nós mesmos. A segunda pergunta: 'Por que temos que procurar nosso rumo sozinhos'?

Eu não sei com o que os meus amigos trabalham, não sei com o que eles sonham, não sei o que querem da vida, e a recíproca é verdadeira. Isso se estende também aos meus familiares – dos mais próximos aos mais distantes. Talvez a resposta venha do medo da rejeição. Ou não temos certeza do que queremos (e por isso não tocamos no assunto) ou temos medo de fracassar e o pior: que os outros tenham conhecimento do nosso fracasso. A terceira e a quarta pergunta: 'Por que temos medo do fracasso e por que temos medo de que os outros saibam dos nossos fracassos'?

Acho que isso acontece devido à nossa criação. Temos de ser sempre os melhores da classe, tirar 10 em tudo, pra termos os melhores empregos lá frente, pra termos os melhores salários, pra termos as melhores casas e os melhores carros. Ou seja, temos que ser Deus. Quinta e sexta perguntas: 'Por que tivemos essa criação e qual a criação que daremos aos nossos filhos'?

Acho que tivemos essa criação porque nossos pais nos amam, e querem o melhor pra gente. Mas acho que eles não pararam pra pensar sobre o que 'é o melhor' e o que 'dizem ser o melhor'. Não ensinaram nossos pais a questionar e estes, por sua vez, não nos ensinaram a questionar. E o que mais preocupa é que não ensinaremos nossos filhos a questionar.

O que é melhor: um bom emprego ou um emprego que lhe faça feliz?

O que é melhor: um bom salário ou o salário que lhe baste pra ser feliz?

Qual salário lhe basta pra ser feliz? Você precisa de um carro ou do status que ele traz?

Por que você precisa de status? Pra impressionar seus amigos?

Você precisava de status quando conquistou estes mesmos amigos?

As perguntas são profundas e as minhas respostas, eu sei, são extremamente superficiais. Mas o que faz sábia uma pessoa? Suas perguntas ou suas respostas? Quem é feliz de fato, o sábio ou o ignorante?

Alguém sabe dizer por que, depois que nos tornamos adultos, só conseguimos conversar com nossos amigos numa roda de cerveja, seja num barzinho, balada ou simples churrasco? Cerveja virou sinônimo de maturidade. Isso é sério? Uma coisa é certa. Quando estamos alcoolizados, mesmo que levemente ou mesmo 'supostamente', podemos nos desnudar e mostrar algumas de nossas respostas pra todos os questionamentos feitos acima, pois a defesa pro julgamento é infalível: '...a, eu estava bêbado!'.

Isso é preocupante.

Mas hoje foi diferente. Hoje eu me permiti não ser Deus, e minhas amigas – transbordando generosidade – também se permitiram. Hoje nós conversamos como seres humanos, sóbrios, sem medos e sem preconceitos (pelo menos até certo ponto, todos temos nossos limites).

Hoje eu redescobri o prazer de filosofar a dois, de compreender e ser compreendido, de ajudar e ser ajudado. Hoje eu redescobri o prazer de jogar conversa fora, de falar sobre frivolidades, de fazer graça pela gracejo, não pelo que ele pode representar pr'aqueles que, desavisados, pensam que falo sério.

Hoje eu descobri o prazer de pedir desculpas e ser desculpado, por algo que talvez não tivesse a mínima importância antes do pedido de desculpas (o que eu duvido), mas que ganhou uma importância enorme em meu coração – e no dela também, eu sei.

Hoje eu descobri o prazer de saber um pouquinho mais sobre o mundo dos meus amigos, e de mostrar um pouquinho do meu mundo – não por interesse, não por hipocrisia, mas pelo simples prazer de conversar! Muito obrigado!

Robson Ribeiro