segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

O telefonema

Ontem, quando saí de casa, o dia estava lindo. O céu azul mais parecia um mar aberto sem ondas. Nem barcos. Nem peixes e muito menos tubarões. O sol estava radiante, os pássaros cantavam e o pessoal fazia seu cooper rotineiro na praça. Como eu poderia imaginar que ia chover?

Mas foi exatamente isso o que aconteceu, e você sabe, eu sempre ando com o celular na mão. Não gosto de andar com mochila e muito menos pochete, então é fácil imaginar o que aconteceu. O telefone molhou, e pifou. Simplesmente pifou, não fazia nem recebia ligação nenhuma! Fiquei molhado e com celular pifado.

Tive que ir até uma loja para comprar outro aparelho, mas você sabe, as lojas só abrem as 10 horas nos shoppings e ainda eram 8 da manhã. Tive de esperar do lado de fora, e foi nessa hora que aqueles dois sujeitos me abordaram:



    • Passa pra cá o dinheiro e o telefone!

    • Como?

    • É um assalto mané, passa pra cá a grana e o telefone, anda!

    • Tudo bem, não precisa grit... AI! Não precisa bater! Toma o dinheiro.

    • E o telefone?!

    • Olha, eu não posso dar o tel... AI! Olha aqui, já chega, não vou dar o... AIAI! Tudo bem, leve o telefone...




Sim, é o que estou dizendo, eles me bateram e levaram o dinheiro e o telefone pifado. É claro que eu poderia ter dado uma lição naqueles sujeitos, mas você sabe, eu sou da paz. Só que sem telefone e sem dinheiro tive de ir ao banco. Passei em casa para pegar o cartão e fui à agência.

A caminho do banco, um acidente horrível! Um motoboy decidiu verificar se os pneus da lotação em que eu me encontrava estavam carecas, e o fez com a van em movimento! Não amor, ele não morreu. Na verdade nem se machucou, mas você sabe, esses acidentes com motoboys geram uma aglomeração dos diabos. Tive de esperar no local até uma viatura da polícia militar chegar e colher os depoimentos dos passageiros. Resumindo, cheguei no banco 12:30.

Fui direto ao caixa automático. Inseri o cartão, selecionei a operação, digitei a senha e... como assim, senha incorreta? Repeti a operação outras duas vezes, e outras duas vezes a senha não bateu. Pois é amor, foi isso mesmo que aconteceu, o cartão ficou bloqueado. Sim, eu tentei falar com o gerente, mas ele estava em horário de almoço, então tive que pegar uma senha e esperar. Ele resolveu o meu problema, por volta de 15 horas, mas tive que ir à boca do caixa sacar com o RG, pois o novo cartão só chega em casa depois de “alguns” dias úteis.

Quando cheguei no shopping de novo já era quase 5 da tarde, então antes de comprar o novo celular, eu fui comer alguma coisa. A “McLanchonete” tava apinhada de gente como sempre, e você sabe, eles sempre apressam a gente na hora de fazer o pedido.

Depois que eu comi, fui pra loja de telefonia. Escolhi o celular mais simples, fiz o plano mais simples, mas na hora de pagar foi complicado explicar que tinha perdido o dinheiro (provavelmente na hora em que paguei o lanche) e não poderia levar o bendito.

Voltei pra casa andando. Pois é amor, três horas de caminhada. Cheguei exausto quase dez e vinte da noite, e você sabe, minha mãe dorme super cedo. E adivinhe só – perdi também as chaves do apartamento e dormi na escadaria do prédio .

E foi por isso que não pude te ligar ontem, amor. Claro que não esqueci nosso aniversário de namoro! Como você pode pensar uma coisa dessas? O quê, você quer terminar? Mas por que amor? Tá cansada das minhas mentiras? Mas é tudo verdade, eu juro! Quê?! Como eu explico o fato de você estar com meu celular em suas mãos neste momento?
' Tudo bem amor, você venceu. Deixa eu te contar a verdade...

Robson Ribeiro

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

O Lobo e a Fênix

Diz a lenda que, muito antes dos seres humanos habitarem a Terra, os animais caminhavam soberanos sobre ela. Eles, os animais, tinham a capacidade de falar, pensar e até mesmo de amar. E é sobre o amor que fala esta história.

Num lugar muito distante, que não posso dizer com exatidão, vivia uma matilha. Este lugar era lindo, composto por altas montanhas rochosas e uma planície esverdeada que inundava tudo ao redor. Nos cumes, sempre se faziam presentes coberturas de neve, apesar do Sol banhar aquele lugar de forma ininterrupta, aquecendo e iluminando a tudo e a todos. Na base destas montanhas podia-se notar algumas fendas muito profundas, e uma destas fendas foi o local escolhido pelo chefe do clã para abrigar a matilha.

O Lobo era ainda muito jovem, e tinha as características de um jovem lobo: era forte e impulsivo. Adorava explorar tudo ao redor, conhecer outros lugares, e por isso mesmo se fazia muito ausente na toca. Ninguém nunca soube o que o Lobo buscava.

Certo dia o Lobo decidiu subir até o cume de uma das montanhas. Não conhecia a neve, e desejava conhecê-la há muito tempo. A subida era muito difícil, pois a montanha era feita de uma rocha muito escorregadia e traiçoeira. Em sua subida, de repente, o Lobo ouviu um lindo canto de pássaro – mas este não era um canto qualquer. Era o canto mais lindo que jamais ouvira! O Lobo ficou em dúvida: queria conhecer a neve, mas precisava daquele canto mais do que qualquer coisa.

Por fim, decidiu-se. Deu meia volta e seguiu o canto, resoluto a encontrá-lo e tomá-lo para si. Em seu ímpeto, o Lobo pisou em falso numa pedra solta, e quebrou uma das patas dianteiras. Soltou um uivo dolorido para pedir ajuda, mesmo sabendo que ninguém de sua matilha poderia ouvi-lo.

Quase cego por causa de sua dor, o Lobo sentiu uma presença inesperada. Seu olfato acusou um leve aroma puro e adocicado. Seus pelos eriçaram-se quando uma onda de calor repentino dominou todo o seu corpo. Um líquido quente envolveu sua pata quebrada, livrando-o de sua dor, e o Lobo adormeceu.

Acordou algum tempo depois. Ao notar o canto, deu um salto e pôs-se de pé, por puro instinto – o canto estava perto demais. Sua pata estava curada, e podia enxergar agora. Estava numa gruta escura e pequena, e à sua frente, junto à parede do fundo, uma ave magnífica de tom vermelho-alaranjado estava pousada sobre uma pedra, cantando alegremente.

Como vim parar aqui, e como minha pata curou-se? - perguntou-se o Lobo.



    • Ei, ave, foi você quem me trouxe aqui?



  • Como resposta, o Lobo obteve apenas o canto.

O Lobo permaneceu na gruta. Gostava muito da companhia da ave, mesmo que não pudesse compreender o seu canto ou por que cantava. Ficou lá por anos.

Mas, com o passar do tempo, a ave foi enfraquecendo. Não havia comida, e os invernos eram rigorosos. E o Lobo não notou nada disso. Tinha se acostumado ao canto da ave, e apenas o canto lhe bastava. Então foi a vez do Lobo sentir sua energia esvair-se, mas tinha medo de sair da gruta e perder sua ave.

Certo dia o Lobo despertou, e notou que tinha dormindo tempo demais. Olhou para a pedra da ave, mas esta não estava mais lá. Ao se aproximar da pedra, notou um punhado de cinzas onde estivera a ave mais linda que conhecera. E então, chorou. Chorou copiosamente, e só podia perguntar: por que me deixaste só?

Então o Lobo pôde ouvir o canto novamente, vindo de fora. Sabia que aquele canto só podia ser de sua amada ave. Mas cansado e ferido, tinha muito medo de voltar para o mundo exterior. Dias se passaram e o canto se repetia, como um convite – não, como um chamado. O Lobo então, definhou e morreu.

A ave chorou novamente sobre o Lobo. Suas lágrimas quentes, ao tocarem o corpo inanimado, queimou-o totalmente, e restaram apenas cinzas. E a ave cantou. O canto mais belo que jamais cantara. Um canto repleto de dor e angústia no início, porém de uma alegria indescritível no final.

Quando terminou, saiu da gruta e alçou voo. Alguns instantes depois, saiu da gruta também o Lobo, jovem e forte como sempre fora. Pôde ouvir a Fênix no céu, cantando, e pôs-se a uivar para acompanha-la. Agora podia compreender seu canto, e porque cantava.

E foi assim, segundo dizem, que o Lobo viveu seu amor. A Fênix no ar e ele na terra. Cada qual seguindo seu caminho, cantando juntos a música que só os dois sabiam, se amando juntos da forma que só os dois poderiam.

Robson Ribeiro

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Sou o que vejo e vejo o que sou

A vida é uma ilusão. Esta afirmação vem sendo feita desde os tempos da Grécia Antiga. Platão, na sua República, reproduziu um diálogo metafórico entre Sócrates, Glauco e Adimanto, a respeito duma alegoria que descreve a vida numa caverna, onde só podem ser vistas sombras da realidade.

Essa noção de realidade também povoa o imaginário artístico há tempos. Como exemplos podem ser citados “A vida é um sonho”, de Pedro Calderón de La Barca, “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley, “1984”, de George Orwell e “Matrix”, dos Irmãos Wachowski. Em todas estas obras, os personagens vivem num mundo onde sua realidade é manipulada e não têm, portanto, noção do que é verdadeiro ou falso.

Na religião, este conflito também se faz presente. Segundo Osho, o mundo que vemos não é o mundo que existe de fato: “...esta árvore que você vê existe sim, mas não do modo como VOCÊ a vê...”. Doutrinas como o Budismo e a Seicho-No-Ie também falam sobre o “despertar para a verdade”, ou seja, deixar de ver o mundo “fenomênico” com nossos olhos carnais e passar a ver o mundo “verdadeiro” com os “olhos da alma”.

Seria a verdade, então, um conceito subjetivo? Acredito no que vejo, portanto o que vejo é verdadeiro? A verdade é verdade até que se prove ser mentira? Mas como se prova ser algo verdadeiro ou falso?

Desta forma, se sou o que vejo e vejo o que sou, posso ser o que quiser! Pelo menos é assim que pensam os produtores do documentário “O Segredo”, baseado num livro homônimo. Se quero ser rico, basta que eu me veja rico. Se quero ser bonito ou amado, basta que me veja assim. Basta que manipule minha própria realidade, de forma consciente.

Sim, de forma consciente, pois costumamos manipular nossa realidade de forma inconsciente, e seguimos inconscientemente numa realidade limitada, se comparada àquela que teríamos se fosse moldada conscientemente.

E a forma como vejo os outros? É real? Conheço mesmo aqueles que estão ao meu redor, ou tenho apenas uma imagem formada, uma pessoa criada com os atributos que eu gostaria – ou não – que ela tivesse?

É comum ouvirmos que idealizamos a pessoa amada, e vemos muito mais qualidades do que ela realmente tem, ou então que os defeitos que vemos nos outros são exatamente aqueles que temos nós mesmos.

Fora do campo artístico-filosófico, o assunto é mais polêmico: quem nunca ouviu falar das famosas “teorias da conspiração”, que vão desde temas irrelevantes como a discussão sobre a morte de Elvis Presley até coisas mais importantes como o contato com extraterrestres, feito em determinada “Área 51”, nos E.U.A.? Pior do que isso: o que dizer das mentiras criadas pelo Comunismo Chinês (entre outros), pela Igreja Católica ou pelo Governo Norte-Americano?

Você acredita na “Guerra contra o Terror”, ou na teoria de que os E.U.A. têm interesses comerciais na reconstrução dos países devastados pela guerra e na exploração do petróleo destes lugares? E quais seriam, então, os reais interesses Norte-Americanos nesta “Guerra ao Tráfico” promovida na América do Sul?

Sob diversos aspectos, a verdade – ou realidade – parece um conceito subjetivo, mutável e manipulável. Como num restaurante “a la carte”, na maioria das vezes nós podemos escolher em que queremos acreditar, mas e quando essa escolha foge de nosso alcance?

Robson Ribeiro